Bebê pode ficar sozinho?

Pós-Parto | 02/11/2021

Carta para Fernanda

E a todas as mães que se interessarem pelo tema

O objetivo da nossa carta é pensar junto com você sobre como a mãe pode cuidar do bebê e se ocupar de outros afazeres e interesses, depois dos primeiros meses de vida.

Não esqueça que uma das primeiras experiências do bebê em ficar sozinho é enquanto dorme. Mesmo que você estiver do lado da L., dormir é uma atividade solitária. Não há como não ser: o bebê só fica em contato consigo mesmo, pois os estímulos externos devem ser neutralizados até para garantir o sono. Portanto a L. já tem a experiência de ficar sozinha, aliás, muito bem, porque já dorme muitas horas seguidas a noite.

O bebê consegue dormir porque foi alimentado com leite e com a presença da mãe.  Essas duas experiências – ser alimentado e ter estado junto da mãe, ouvindo sua voz, olhando nos seus olhos e sendo olhada, fornecem um repertório importante para que o bebê possa dormir tranqüilo tendo a expectativa de reencontrar-se com a mãe, ao acordar.

Um dos significados de ficar sozinho é ficar por sua conta, é dar tratos à imaginação e se distrair com o que tem para ser visto, ouvido, brincar com as mãos e depois com os pés. Pode estar fisicamente em companhia da mãe, do pai, ou de outra pessoa que cuide, mas que naquele momento não se ocupa diretamente dela. Você pode levá-la para a cozinha, acomodá-la no bebê conforto e se concentrar em alguma atividade que não inclua a L.. Ela está com você na cozinha, mas você está se ocupando com outra coisa. Você está concentrada em cozinhar, em ler, em falar ao telefone. Você abrirá uma possibilidade para a L. se ocupar por ela e com ela mesma, descobrindo suas competências criativas.

Quando o bebê nasce ele é completamente dependente; tão dependente que ele e você, do ponto de vista dele, são apenas um. Não há dentro e fora.  E você sustentou isso muito bem, ficando à disposição da sua filha todo o tempo em que ela ficava acordada. O bebê recém-nascido se ficar sozinho, ele simplesmente não é. Não pode existir sozinho. Nos primeiros meses de vida você foi se adaptando a L. respondendo a tudo que ela precisava, você foi se ajustando a ela de muito perto, e todo o tempo.

Agora, aos 5- 6 meses L. pode começar a ficar só, na sua presença, para que possa ir fazendo a experiência de ser ela mesma. É um momento criativo onde ela começa a se apropriar do mundo à volta dela. Não se trata de perder o contato com a L., mas de você mesma experimentar um contato mais sutil com ela. Poder olhar para outra pessoa, que não ela, na presença dela. Aos cinco meses o bebê já pega objetos na mão, já os empurra, explora e já pode ficar sentado com apoio e olhar o que está à sua volta de outro ângulo. Os brinquedos são para o bebê, uma extensão do adulto, e ela reinventa seu uso ao seu modo.

Em nenhum momento qualquer um de nós fica completamente independente. Autonomia absoluta não existe. Sempre precisamos e precisaremos manter contato com outros. Em qualquer momento da vida. Nos separamos e nos re-unimos. Vamos e voltamos. Esse movimento o bebê começa a aprender com a mãe, que também vai e volta.

 

Eva Wongtschowski é psicanalista, participa das Rodas de Conversa do Gamp21 e realiza atendimento clínico, presencial e online.